A Sindourela
Era uma vez, uma linda donzela, que de donzela nem mais o nome, conhecida por Sindourela. A bela moçoila, tinha os olhos verdes como um abacate, pele clara como o leite e de uma textura aveludada como um pêssego. Dava até vontade de comer.
Sindourela era boa, e muito boa, segundo as vistas dos machões da vizinhança. Caridosa que só ela. Era só pedir que já estava lá, doando toda sua bondade e pureza – na verdade, a pureza doou apenas uma vez.
A doce e safada Sindourela, vivia num barraco próximo à floresta principal da cidade, conhecida também como favela, juntamente com uma tia, que era irmã de criação de sua madrasta e mais duas primas, funckeiras. Todas três tiradas da prostituição nas ruas, por um bom moço cafetão, para finalmente terem um lar aconchegante e bonito, onde poderiam comer, dar de comer, beber e se divertir bastante. Até que a polícia descobriu naquele lugar, mulheres adultas e crianças em atos ilícitos, vendendo seus corpos para homens sem-vergonhas. Infelizmente o bom moço, coitadinho, acabou morrendo numa troca de tiros com “os home”.
As moças então, foram obrigadas a se virarem sozinhas.
Certa vez, encontraram Sindourela fugindo dos “truta”. Se reconheceram, e foi então que começou a parceria. Sindourela na época, era a “manda-chuva”, naquelas regiões da favela. Porém um dia, se viu presa numa das bocas do beco, onde “uns maluco” ameaçavam-na de morte se ela não pagasse “as dívida, ta ligado?”. Era muita “treta”, digo, muita confusão para o lado da Sindourela, que estava envolvida até o pescoço com os traficantes da área e sua batata estava realmente assando.
Contou sua história para as parentas que, com muita pena da pobre moça, que já estava ferrada mesmo, resolveram ajudá-la, entrando num acordo: Sindourela descolaria um barraco pras três morarem e, como recompensa, elas esconderiam-na de todo e qualquer vagabundo.
Aceitando a proposta, as quatro senhoritas viveram bem até a segunda semana. Foi então que os desentendimentos começaram:
- Vem lavar esse banheiro sua porca nojenta! Tem cabelo no ralo!
- E esse cabelo é só meu, por acaso? Desde quando tenho um cabelo louro oxigenado desse jeito?!
- Não deixa essa calcinha no meu colchão!
- Cadê meu esmalte vermelho??
Sindourela que estava acostumada com frescuras apenas na hora do polimento de sua AR-15, achou que enlouqueceria convivendo com tanta biscate ao mesmo tempo e resolveu fugir, sem dizer para onde ia, na calada da noite.
Seu plano era perfeito, mataria o dono da boca, pegaria uma boa grana e partiria direto para o México, onde faria a travessia para os EUA. As “passagens” já estavam reservadas, e ela não poderia perder o último circular para o aeroporto, que passava nas proximidades por volta da meia-noite. Sindourela, tinha o grande sonho de, depois que a poeira baixasse, voltar para o Brasil disfarçada de Débora Secco – ela realmente era muito fã da atriz.
Tudo pronto. E o resultado... magnífico! O filho da mãe estava morto e não sobrara nenhum trocado pros “fim de carrera”. Sindourela desceu o morro com o maior cuidado para não ser notada, quando, de repente, ouve o despertador de um trabalhador que faz o turno da madrugada numa fábrica da zona sul da cidade dar o aviso: era meia-noite.
Sindourela sem pensar duas vezes, saiu correndo pela escadaria do morro, viu o circular virando a esquina e correu, correu, correu como nunca. O salto de seu Scarpan (Maldito! Comprado num Brechó), quebrou. E Sindourela rolou escada abaixo, como nunca havia rolado.
Além de ter quebrado a perna direita, Sindourela teve traumatismo craniano e encontra-se internada até hoje em algum hospital, sabe Deus onde, sendo atendida, sabe Deus como, pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
As parentas biscatinhas, venderam o barraco e voltaram para rua. E os sapatos? Ninguém nunca os encontrou.
FIM
MUNDICS 2006 - Faculdade Pitágoras/Metropolitana - Londrina
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